Nesses dias de confinamento resolvi ventilar a cabeça nos livros, filmes, música e na arte. Diante de tantos títulos de livros, um chamou minha atenção, “O Longo Caminho para a Liberdade”. A primeira frase da contracapa foi determinante para a escolha: Nelson Mandela passou 27 anos na prisão. Então pensei: o que são alguns meses de isolamento diante desse número? Na autobiografia de Madiba, como é carinhosamente chamado pelos sul-africanos, pincei a frase, “Vamos deixar a liberdade reinar”.
Assisti depois “La Trinchera Infinita”, título que apesar de quase spoiler é tensão do primeiro ao último minuto. O filme espanhol de 2019, dirigido por Garaño, Arregi e Goenaga, se baseia na vida real de Manuel Cortés, republicano que para não ser pego pelos franquistas, se autoenclausurou por mais de 30 anos num exíguo espaço entre duas paredes.
Ambos, livro e filme, belos e tocantes…. mas era consolo para minha reclusão o que eu buscava? Não. Fui então escarafunchar na minha memória exatamente o oposto, os dias em que vivi uma extrema liberdade. Quem me proporcionou com seu exemplo esse livre voo?
Precisei só de alguns minutos para responder: um rio! Um rio? Isso mesmo, mas não um rio qualquer. Um rio que tem caminho aberto, que não conhece limites, que diferente dos outros não deságua num lago, em outro rio e nem mesmo no Oceano. E despeja aonde? Ah! Ele se espraia livremente nas areias de um deserto.
Vou apresentá-lo: o Rio Okavango nasce em Angola, percorre 1.400 quilômetros e derrama suas águas no deserto mais seco da África, o Kalahari em Botsuana. De maio a junho, época das chuvas, suas águas engrossam e na planície árida cria o maior delta interior do mundo formando um labirinto de canais, lagoas, riachos, pântanos e ilhas. E melhor, graças à sua audácia ele muda o mundo à sua volta. A terra irrigada alimenta milhares de peixes, aves, répteis e mamíferos.
Do espaço, o Delta do Okavango tem a forma de uma árvore cujo simbolismo é a capacidade de vencer desafios. Penso que o Okavango pode nos instigar a soltar nossas ideias, deixar nossos pensamentos livres para fazer o que nos der na telha. E, até mesmo sonhar com uma viagem ao Okavango.
O rio ao inventar sua própria liberdade encontrou seu caminho. Que tal fazermos o mesmo?