Construir um hotel à mão, em fina sintonia com a natureza ao redor, com materiais e artigos produzidos na região – da madeira aos lençóis – era o sonho acalentado e ao mesmo tempo desafio dos Petersen: Zanza, Bubi e seus quatro filhos.
O local para plantar o hotel já tinham, um belo e amplo terreno que acompanhava as suaves ondulações da colina diante dos volteios do Lago Pinhal, a nove quilômetros da cidade de Rio dos Cedros, interior de Santa Catarina.
Esse pedaço de terra já foi mais de alemães, italianos, húngaros e poloneses. Para os imigrantes, o Brasil era a “Geografia da Esperança”, como definiu a escritora Christina Baumgarten, neta dos primeiros colonos alemães, tal como os Petersen. Acostumados a acolher na própria casa, ao redor de mesa farta os familiares, amigos, e a galera jovem dos filhos, enxergavam um hotel como algo muito maior do que um agradável espaço para descanso. Queriam sobretudo dedicar aos hóspedes uma hospitalidade que abarcasse tudo o que herdaram do convívio de pessoas com múltiplas nacionalidades.
E assim, com entusiasmo contagiante, toda família colocou mãos à obra, do projeto aos móveis, da louça as arandelas, das cortinas ao jardim. Foi um tal de tece daqui, borda dali, pinta acolá, monta, recria, inventa, flores por toda parte e … fez-se o Hotel Parador da Montanha.
O hotel é um meio de contar a história dos imigrantes. A começar pela região onde se localiza – Rio dos Cedros – para onde foram as famílias italianas com muitos bambini. Ao chegarem em terras catarinenses a estranheza no primeiro prato de comida: nossa farinha de mandioca. Giuseppe, lembra que seu avô pensou que os brasileiros comessem serragem. Depois foi preciso vencer a mata, arrancar árvores, e com essa madeira bruta erguer casas rústicas e preparar a terra para o cultivo.
Rio dos Cedros hoje é abraçado por arrozais com seu verde brilhante, videiras e de dezembro e janeiro, de verdadeiros paredões de hortênsias que margeiam as estradas e trilhas para seus lagos. O local convida a longas caminhadas, cascading na Cachoeira dos Índios, canoagem, rafting, e o ideal para nós foi estacionar o carro e percorrer as trilhas e os caminhos de bicicleta.
A partir de Rio dos Cedros fizemos um itinerário de múltiplas faces para conhecer algumas cidades, sempre com as bikes no bagageiro. Em poucos quilômetros é como se cruzássemos diferentes países europeus e pudemos notar como as pessoas guardam traços fisionômicos com muita semelhança em relação aos seus antepassados. São brasileiros com cabelos cor de pinhão ou de cidra, pele da cor da neve, olhos de mar, e bochechas parecendo ferro em brasa.
Nessa terra tutti-frutti nos encantou reconhecer as peculiaridades de cada lugarejo: plantações de bananas, arquitetura típica, gastronomia feita de produtos regionais, queijarias, vinícolas, as tradições na música e dança, e as crenças nas igrejas e templos bem cuidados.
Primeira parada: Pomerode que fica pertinho, apenas 17 quilômetros. Na cidade descemos as bicicletas para percorrer a Rota do Enxaimel. O enxaimel é uma milenar técnica de construção onde as vigas e colunas de madeira são preenchidas por tijolos. As casas parecem muito aconchegantes, com ar de limpeza e ordem, fornos a lenha que exalam aroma de pães sendo assados, jardins sempre floridos, hortas e árvores frutíferas de cujas frutas se produzem geleias e compotas divinas.
Os hábitos também permaneceram intocáveis nos pratos tradicionais, como kassler, costeleta de porco; ribbelsupp, sopa esfarelada; eisbein, joelho de porco e doces como kolonie kuchen; quarktorte, e a tradicional apfelstrudel, torta recheada com maçã, uva passa e canela.
A “Pérola do Vale” como carinhosamente Timbó é chamada pelos seus habitantes, dista 19 km de Pomerode, e é classificada pela ONU como uma das melhores do Brasil para se viver. Sabe o que nos encantou ali? O Museu da Música instalado no Salão Hammermeister, construção rústica, mas imponente. O acervo do museu compreende mais de 300 instrumentos musicais de vários tipos e épocas, além de outros objetos relacionados à música.
Também vale conhecer o Museu do Imigrante, em casa colonial que preserva a história e a identidade dos primeiros alemães, os utensílios domésticos, entre eles o “harssegen”, um tipo de pano bordado que decorava paredes. Feitos ainda como seus antepassados são o especial kochkase, queijo envelhecido por três dias, o pão heringsbrot, e o schwartzbrot, pão de centeio.
O próximo destino, Rodeio fica 18 km de Timbó. Ali, novamente pegamos as bikes para um roteiro especial, a Rota dos Anjos. “Sou o homem mais feliz do mundo. E olha que isso não é pretensão”. As palavras de Paulo Notari, criador e realizador desse caminho azul com mais de dez quilômetros de estrada margeada por hortênsias e 64 anjos. E, por que Notari fez tudo isso? Porque “o belo exterior produz o belo interior, contagia e traz amor”.
Outras palavras, desta vez do escritor e crítico de cinema Paulo Emilio Salles Gomes (1916-77) caem como luva: “Como todas as coisas do mundo, coisas importantes e menos importantes, é muito bom encontrar com outra gente, porque acontece, às vezes, que nesses encontros de repente pode-se encontrar a si mesmo”. Assim foi com os Petersen que se encontraram a si mesmos na construção do hotel e fizeram muitos novos amigos. Se você também busca uma viagem assim, buon viaggio, gute fahrt, e será muito bem-vindo, benvenutto, wilkomenn, fogadtatás, witamy, como dizem italianos, alemães, húngaros e poloneses!
Onde ficar para uma experiência de cruzar países em único lugar?
Hotel Parador da Montanha – Em Rio dos Cedros, tel. (47-99103-7998 Localizado ao lado da Barragem Pinhal, aproximadamente 70 km de Blumenau www.paradordamontanha.com.br
*Matéria publicada originalmente no nosso blog Viagens Plásticas do Viagem Estadao
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