A vontade de viajar, nesses tempos, enverga mas não quebra. Preciso viajar. No momento sou um viajante imóvel, daqueles que partem sem partir, a não ser na memória e na imaginação. Então, preciso exercer sempre esse poder, capaz de transcender as fronteiras do tempo e do espaço. Cara, e como vou longe!
O escritor Xavier de Maistre foi dos primeiros a realizar essas façanhas em seu livro “Viagem ao redor do meu quarto”; já, eu conto com a memória saltitante e vou revisitar o melhor museu que conheci. Sorry people! Nada a ver com Louvre, Britânico ou Hermitage, mas daqueles museus menores que me trouxeram uma montanha-russa de emoções.
Já chego lá. Estou em Basileia, considerada a capital cultural da Suíça. Ela se abre para todos os olhares, num contraste entre tradição e futuro. Uma cidade disposta a aproveitar a vida. E não por menos ali se encontra o Museu Tinguely, que guarda o mistério da minha transformação de adulto em criança.
Existem artistas que marcam sua trajetória não apenas pela excelência de suas obras, mas também por transmitirem algo a mais. As grandes instalações de Jean Tinguely (1925-91) são máquinas artísticas cujas construções elevam às alturas a imaginação da criançada, em que me incluo.
E – putz! – Me deixe definir como eu vejo as obras aqui. Geringonças com talento! Consciente que há um desejo genuíno por brincadeiras nos seres humanos, o artista não faz média e joga para a galera em obras que ‘fazem de conta’ – como um mapa de tesouro para cada um descobrir uma aventura e provocar a imaginação.
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As instalações de Tinguely são diferentes. Rodas, polias, pneus de tratores, espelhos, correntes, manivelas, manequins, cortinas, tudo junto e misturado a sons, ruídos, aromas, luzes e esguichos d’água aleatórios. Ufa! A cenografia se completa com a luz interior do museu ao fazer as sombras gigantescas desses artefatos metálicos uma realidade e não um reflexo. Agora vem o melhor: com um toque num interruptor essa parafernália toda de estrutura de ferro se movimenta, criando no meu devaneio as brincadeiras de criança quando tudo podia se transformar em navio, máquina do tempo, avião… E ainda mais, em muitas dessas ‘instalações’ pode-se viravoltear por dentro delas.
Para mim Jean Tinguely é o maluco beleza da arte cinética, aquele cuja obra artística é arrancada do contexto museográfico e restituído à sua origem lúdica. E esta não é outra tarefa do pensamento ao ver uma obra de arte?
Eu peguei gosto por esse museu, e não teve uma única vez que fui à Suíça e não dei um pulinho ali.
Fala sério! Não é bom voltar a ser criança?
*Matéria publicada originalmente em nosso blog Viagens Plásticas do Viagem Estadão