As exuberantes praias das Ilhas Malvinas, no extremo sul do nosso continente, são exclusivas das minas, que por sinal não dão bola para ninguém e são bem explosivas
Nas Ilhas Malvinas (Falklands, para o resto do mundo que não faz parte do Mercosul) as mais belas praias ao redor de Puerto Argentino (Port Stanley) deixam os manos de fora. Nelas só as minas têm vez, e mandam no pedaço (e aos pedaços), de quem se atrever a bulir com elas. É só triscar que destroem o cara, literalmente.
As minas dali são aquelas explosivas, escondidas nas areias brancas como neve e finas como giz, e deixadas pelos argentinos no final da guerra de1982 contra os ingleses. Como nossos hermanos se negam a dar o mapa das minas, e por serem de feitas de plástico, difíceis de detectar, o governo da ilha interditou a entrada dos banhistas. E, as águas azuis e límpidas viraram um desejo proibido.
É quase impossível pensar nesse arquipélago e não lembrar das cenas de guerra que aconteceram em sua geografia inóspita. A paisagem, monótona, árida, desértica, toda em tons castanhos e sem a riqueza das sombras, sugere uma terra arrasada. Árvores, nem pensar! As montanhas nuas apenas com vegetação esparsa, perdidas na imensidão da planície, atingem no máximo 500 metros de altura. Quanto mais percorremos as estradas e trilhas, sem topar com uma alma penada sequer, só pensamos em uma coisa: por que argentinos e ingleses brigaram tão feio por esse lugar onde quem manda mais é o vento?
Fui até as Ilhas Malvinas para escrever sobre as últimas batalhas dessa guerra, que o escritor Jorge Luis Borges assim definiu: “dois carecas lutando por um pente”. Mas agora meu assunto é outro.
Existe uma outra Malvinas. E foi essa que encontrei.
São mais de 700 ilhas. Focas, pinguins, leões marinhos, colônia de albatrozes, enseadas, baías, penhascos, e planícies rochosas. Ao entardecer, nos dias de verão, surge no céu uma paleta de cores surrealistas realçadas por uma luz mágica que reluz nas planícies cor de cobre.
E, belas praias, mesmo que algumas mantêm a plateia à distância. Diferente do interior, despojado de detalhes e envolto em um silêncio quase monástico, o litoral é rico em cores, sons, e acidentes geográficos. Nas areias com vegetação rala refugiam pinguins magalhânicos, os simpáticos rockhoppers, com tufos espetados ao redor dos olhos e com cara de bandido. Além dos pinguins imperadores com jeitão desengonçado e andar chapliniano, que curiosos se aproximam e parecem dar as boas-vindas aos forasteiros.
A hiper-realidade dessa paisagem se completa pela presença de baleias e orcas que se agigantam e mergulham. Isto é só uma parte dos atrativos aos quais se rendem os visitantes.
Ao sobrevoar as ilhas, com seus contornos de enseadas múltiplas, é impressionante a sequência das praias. Elas revelam uma visão poderosa entre o mar e a forte presença de vida animal. Um cenário que pode mudar a qualquer momento, e o que era antes um mar semelhante a um lago tingido de azul índigo ou de verde esmeralda se faz agora crispado em altas ondas.
Em tal assombrosa paisagem, como num passe de mágica, se desenha Puerto Argentino (Port Stanley), a capital do arquipélago. Ao longe, a placidez que emana de suas casinhas coloridas nos remetem ao mundo fantasioso das cidades infantis dos jogos de armar da Lego. Tudo ali se encaixa perfeitamente: a arquitetura das construções pré-fabricadas, os jardins floridos e bem cuidados, a mão de direção inglesa – à esquerda -, os Land Rovers que parecem ser os únicos veículos que os kelpers (como são conhecidos os habitantes das ilhas) conhecem.
Sem contar a hospitalidade e o bom humor de seus habitantes, os pubs que dão seu ar de graça na happy hour, o futebol que corre solto no verão, e o squash – esporte preferido nos dias frios e chuvosos – tudo nos transporta de imediato a uma cidade do interior da Grã-Bretanha.
Enfim, pode-se traduzir as Malvinas como uma nova maneira de viajar. Um itinerário que reúne o registro visual marcante de paisagens inéditas. Uma viagem pontuada pela aventura que agrega o sabor do conhecimento. Ou será vice-versa?
Como ir:
Não é fácil chegar ao arquipélago das Malvinas, extremo sul das Américas, a 550 km da Patagônia argentina. É preciso fazer combinações de voos até Punta Arena, Chile, e de lá para Puerto Argentino, capital das ilhas. Ou ir até Oxfordshire, Inglaterra, pegar um avião da RAF (Royal Air Force), com escala na ilha de Ascenção, no Atlântico Sul.
Mais recentemente, a LATAM informou que abriria um voo de São Paulo com escalas de para as Ilhas Malvinas
Onde ficar:
Pela quantidade de lojinhas de suvenires, hotéis e bed and breakfast que pontilham pelas ilhas, nota-se que agora são ecoturistas que invadem as Malvinas.