São muitos os mistérios da Catedral de Nossa Senhora de Chartres, distante apenas uma hora de trem de Paris. Onde não há palavras, falam as imagens e as sensações.
Estou diante de uma obra-prima construída no século 4. Seu efeito hipnótico me afeta em etapas. No exterior cada uma de suas nove portas com frontões esculpidos me conduziu direto para a época medieval, e no interior em contraluz sou fulminado pelos raios dos 176 vitrais que reverberam com a incidência do sol.
Gigantescas colunas, abóbadas e 4.000 esculturas dão unidade ao conjunto e criam uma beleza incomum que exige silêncio e respeito.
Penso que um investigador do oculto ali pode até entrar em estado de graça, mas a realidade é que a arquitetura e os vestígios arqueológicos fornecem algumas pistas. Camadas superpostas de ruínas, galerias e evidências da civilização dos celtas que ocuparam a Europa a partir do século 5 a.C, foram encontradas ao redor da catedral.
Alguns historiadores se referem a aspectos da religião celta pagã, cuja origem pode estar situada em épocas da pré-história. Eles afirmam que ali existiu “uma classe sacerdotal poderosa que talvez incluísse os próprios druidas”.
A cripta contém um santuário dedicado à Nossa Senhora do Subterrâneo. Sua principal característica é que Ela tem os olhos fechados, como se quisesse nos dizer: “prestem atenção no Menino, não em mim”. Porém para muitos estudiosos esta Virgem “liga-se à antiga tradição das Virgens Negras que podem ser encontradas em muitos templos cristãos europeus e que correspondem ao culto da Grande Mãe Terra dos druidas”.
Por abrigar uma relíquia sagrada, o véu que dizem ter pertencido a Nossa Senhora, na Anunciação, a igreja foi um dos santuários de peregrinação mais populares da Europa medieval.
Porém, a singularidade da catedral recai sobre o labirinto gravado no piso com pedras pretas. Com diâmetro de 12,6m é a projeção da rosácea principal rebatida no chão. O Ponto e o círculo – Deus e o mundo.
“A fé se expressa por uma caminhada desde o tempo de Abraão, e ao empreendê-la torna-se uma jornada para o autoconhecimento. Mesmo para quem não é cristão, ela vai colocar seu olhar para dentro de si mesmo”, me revela o teólogo brasileiro padre Juarez de Castro.
Percorrer seu traçado significaria liberar o espírito em busca da paz. O labirinto de mosaico, nas igrejas medievais que levam os caminhantes a um centro, é a metáfora espiritual de uma jornada rumo a cidade santa de Jerusalém, rumo a iluminação.
Em Chartres tem-se a sensação de um mundo paralelo. A mandala espiritual adquiriu grande significado na devoção dos leigos e muitas gerações experimentaram a alegria de chegar ao centro do labirinto.
A partir daí o beneditino John Main foi além: ele não considerava a meditação simplesmente um método de oração, mas sim uma peregrinação. Meditar é um caminho de experiência, e não de pensamento ou imaginação. Realizar a peregrinação do labirinto, com devoção, assim como meditar, ilumina a jornada de nossa vida.